É muito comum várias prefeituras brasileiras, especialmente as de pequeno porte, realizarem doações de peixes durante a Semana Santa. Será que estas doações durante um período certo e determinado de tempo podem ser consideradas legais? Quais os requisitos e cuidados as prefeituras devem adotar caso queiram efetuar este tipo de doação?
Inicialmente, é importante frisar que a doação de peixes para pessoas carentes durante o período da Semana Santa parece ter um viés mais costumeiro ou eleitoreiro do que propriamente o objetivo de retirar as pessoas necessitadas do estado de carência em que se encontram.
Pois, é fácil perceber que nenhum programa social que tenha duração de apenas um dia resultará na diminuição da carência da população.
Ainda que se questione o caráter assistencial e a eficácia de um programa de doação de alimentos apenas em determinado dia ou época do ano, a concessão de benefícios (peixes) a pessoas carentes deve atender as regras das subvenções sociais descritas na Lei nº 4.320/64 e na Lei Complementar nº 101/2000.
Além desses instrumentos legais, outros cuidados também são essenciais a fim de evitar a reprovação das contas do gestor junto aos Tribunais de Contas.
O primeiro ponto que as prefeituras devem obedecer para concessão de peixes durante a Semana Santa é inserir essa ação social como uma etapa de um programa mais amplo e permanente de assistência social. Ou seja, a lei de criação de determinado programa social deve prever várias ações de combate à pobreza, uma delas seria a distribuição de peixes no período da Semana Santa. Com isto, evita-se que o Tribunal de Contas questione a eficácia de um programa social limitado a determinado dia ou período do ano.
O segundo ponto de destaque diz respeito a vedação imposta pela Constituição Federal de o Poder Público subvencionar cultos religiosos e igrejas ou manter relações de dependência ou aliança com entidades doutrinárias (art. 19, I). Além disso, o gestor deve lembrar que nem toda sociedade possui o ritual de não comer carne durante a semana santa. Existem diversas outras religiões que não seguem esta orientação. Dessa forma, a doação de peixes durante o feriado da páscoa não pode estar associada a determinado grupo religioso ou a certa entidade. Isto é, o principal critério para escolha dos beneficiários do programa não deve ser religioso, mas de necessidade e renda.
A impessoalidade e definição de critérios objetivos não religiosos deve ser antecedente ao programa de distribuição de peixes. Esses parâmetros devem estar previstos em lei municipal que regulamente o programa de assistência social. Logo, é importante que exista na Secretaria de Assistência Social um cadastro prévio de todas as pessoas aptas a receberem o benefício social.
Outro fator preponderante na execução do programa de doação de peixes é a necessidade de comprovação de que as pessoas contempladas receberam efetivamente o benefício. Ou seja, a destinação dos peixes devem ser comprovadas mediante recibo ou documento similar assinado pelo beneficiário.
A distribuição direta do peixe pelo prefeito às pessoas carentes também deve ser algo a ser evitado, a fim de descaracterizar o fim eleitoreiro do programa. Desta feita, o recomendado é que a ação social seja conduzida diretamente pela Secretaria de Assistência Social, seguindo os trâmites normais de qualquer outro programa de combate à pobreza e de inclusão social.
Por fim, apesar de óbvio, não é demais relembrar a necessidade de prévia dotação orçamentária e licitação para aquisição dos peixes a serem distribuídos. Além do mais, os preços de aquisição devem ser precedidos de pesquisa indicando que estão compatíveis com os valores praticados no mercado. As informações são da Revista de Gestão Pública Municipal.