O Vaticano anunciou nesta terça-feira (01/06) uma histórica reforma do Código de Direito Canônico, a primeira desta envergadura em 40 anos, a fim de endurecer as punições a clérigos que cometem abusos contra menores de idade, mas também contra maiores em certas situação de vulnerabilidade.
A modificação inclui, além disso, um artigo que define a pedofilia como “um crime contra a dignidade humana” passível de resultar na expulsão do clero, algo que as vítimas vinham solicitando havia décadas. A reforma, na verdade, organiza dentro do novo código todos os avanços legais que já vinham ocorrendo nos últimos meses, especialmente depois da cúpula contra os abusos realizada em 2019 no Vaticano para estabelecer as bases de um novo olhar da Igreja para o assunto.
Como novidade, o documento equipara determinados abusos contra maiores de idade a situações de pedofilia. Por exemplo, quando um clérigo se valer da sua posição de poder sobre outra pessoa com finalidades sexuais, estará sujeito às mesmas punições impostas a quem comete abusos contra crianças e adolescentes.
Essa modificação busca combater o problema dos abusos em seminários —onde os alunos são maiores de idade—, que se encontra na base dos últimos grandes escândalos da Igreja, como o caso do cardeal norte-americano Theodore McCarrik, obrigado a deixar o clero após a revelação de que abusou sistematicamente de seminaristas na década de 1980.
O novo código entrará em vigor em 8 de dezembro, dando tempo às dioceses para o que o estudem antes disso. Ele especifica de forma mais clara os delitos, separando alguns que antes eram agrupados sob o mesmo guarda-chuva, ao introduzir modalidades como a pornografia infantil.
Também as sanções passam a ser descritas de forma exaustiva e se introduz uma novidade relevante: a possibilidade de suspender e punir todos os fiéis que cometerem delitos de abusos e tiverem algum tipo de responsabilidade na Igreja, mesmo que em tarefas auxiliares. Isso significa que o código não será aplicado apenas a clérigos, mas também a fundadores de movimentos religiosos laicos ou administradores de templos católicos. A mudança afetaria muitos dos grandes escândalos vividos na Igreja nos últimos anos que permaneceram impunes por falta de ferramentas para serem julgados.
O Código de Direito Canônico entrou em vigor em 1983 e, desde então, não passou por nenhuma reforma tão relevante. O documento, de uma dureza discutível, saiu depois do Concílio Vaticano II e foi muito questionado por alas que consideravam que a Igreja não precisava dessas leis.
O papa Francisco considerou agora que era “evidente” a necessidade de mudanças. “Muitos foram os danos ocasionados no passado pela falta de compreensão sobre o relacionamento íntimo que existe na Igreja entre o exercício da caridade e a atuação da disciplina sancionadora”, admitiu o Pontífice.
O Código incorpora também punições econômicas para os abusadores, o que pode incluir a redução de salários e multas. Mas também acrescenta crimes como a tentativa de ordenar mulheres, deixar registro das confissões, promover a consagração eucarística com finalidade sacrílega, a corrupção em atos de ofício e a administração de sacramentos a pessoas a quem eles estejam proibidos. Por Ópera Mundi – Foto: Daniel Verdú